PARA ONDE VAI O
AMOR QUE NÃO SE REALIZA?
É muito difícil
orientar os filhos sobre relações amorosas. Com o advento da independência
financeira da mulher, cada vez menos papai e mamãe sugerem que a filha ou filho
termine o namoro com aquele moço ou moça porque não é do mesmo nível social,
não vai ter condições de dar o conforto com o qual ela está acostumada, ou, no
caso do rapaz, a esposa não vai saber se comportar diante dos amigos dele.
Graças a Deus,
porque ainda existem pais que fazem isso, por falta de capacidade de observação
já que nas suas próprias famílias devem existir tios e tias que casaram com
quem os papais e mamãe faziam gosto e o escolhido se revelou um incapaz para
construir uma vida produtiva, enquanto que a filha sofreu muito ao desistir de
um namorado de juventude porque não tinha eira nem beira e hoje vê uma amiga
com ele, um sucesso na profissão em que pouco a pouco conseguiu se firmar, os
filhos tendo acesso às melhores escolas, os melhores cursos, viagens e, o que é
mais importante, dando valor para tudo porque sabem que pai e mãe lutaram para
conseguir proporcionar aquela vida para eles.
Há poucos dias
eu e uma amiga conversávamos sobre a neta de uma conhecida nossa que foi
proibida de namorar um moço porque ele não pertencia a uma das famílias mais
prestigiadas de Erechim ou Passo Fundo, não recordo a cidade. O jovem era
pianista de um conjunto local, não conseguiu ir para a
Universidade e os pais
da moça chegaram à conclusão que se não era rico tinha que ser pelo menos
médico ou engenheiro para a filha poder frequentar a sociedade de igual para
igual com as amigas de infância. O rapaz entrou para o exército para tentar
estudar, seguiu os passos dela, se encontraram algumas vezes até que a vida
social dela os separou. Ela casou com o filho de um fazendeiro (já disse várias
vezes que filho de rico não é rico, isso não é Alzheimer) que não tinha
desenvolvido o hábito do trabalho, teve oportunidade de fazer parte de um curso
superior, porque o dinheiro também paga universidades, e o patrimônio começou a
mermar até que acabaram sem nada.
Separados, a
senhora reencontrou o antigo amor, mas era tarde. Ela estava com uma doença
grave, uma expectativa de vida muito curta. Ela conseguiu até prolongar
bastante esse período em que se encontrou com o ex-namorado, mas um dia veio a
Porto Alegre para vê-lo e, sentados à beira do Guaíba, na hora que o sol se
punha e o rosto cansado dela resplandecia com os reflexos, disse-lhe: Pedro,
ainda não foi desta vez.
E o leitor deve
estar perguntando, se é uma história real como é que a dona Maria Clara sabe
tantos pormenores. Ah, porque a Maria Clara aqui vinha pela Rua da Praia outro
dia e o encontrou. Foram tomar um café no terraço da Casa de Cultura e ele
contou a história dele com a moça – do primeiro encontro, enquanto ele tocava
piano e ela dançava com os moços da classe social dela, até a hora da
despedida.
E passei dias me
perguntando: essas pessoas que são impedidas de viver um amor têm um sentimento
dentro de si que às vezes até transborda e é transferido para sua relação com o
mundo. São esses seres amorosos que encontramos às vezes e nos tratam com tanta
gentileza que parece que nos conhecemos de uma vida inteira. Mas essa torrente
de sentimento positivo tem um objeto e se não pode se direcionar para ele, para
onde vai? Há pessoas que enlouqueceram por não terem se realizado no amor,
afinal, para onde vai o amor dessas pessoas que não o podem entregar para o ser
amado?
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