O VAZIO AO LADO
Mortas as
palavras, garganta seca, restava esperar que a escuridão os conduzisse ao sono.
Era quase verão e a desesperança tinha atravessado três estações para chegar ao
limite do cansaço. E sendo a realidade das faces comprometedora e demasiado
fria, deram-se as costas para o equilíbrio da estranha balança que os
sustentava. Já não eram senão o vulto opaco que o tempo tatuara na memória; um
copo pela boca à espera da última gota. E o silêncio, a pesar sobre os pesares.
Mas naquela
noite, instante suspenso de uma tormenta, algo incomum atravessou os anteparos.
Desvelada, a dormência se fez movimento e em busca de trégua, navegou os
lençóis. O coração disparou, faltou o ar, sumiu o chão. E como náufragos,
boiaram sob o céu constelado em busca de um único gesto que os salvasse. As
mãos, até então recolhidas, deslizaram. Pétala de delicada textura, a pele
cedeu aos afagos. E o vazio ao lado se dissipou.