quarta-feira, 7 de outubro de 2015

TALES E ELA - Conto de Danelize Martins Gomes (Uruguaiana, RS)

TALES E ELA

Tales era menino mirrado, mijado pela mãe e cagado pelo pai. Vivia pela rua tipo bicho, correndo de um lado pro outro. Num dia almoçava na casa da avó, noutro pernoitava ao lado da tia. Olhava os outros com olhos esbugalhados, sorriso amarelo e uma barriga cheia de fome.

De manhã, devorava pão com manteiga, um copo de leite e se vestia com a roupa que tinha. Só encontrava sossego no colégio. Entrava na sala voando. Sentava na última fileira, quase agarrado pela parede. Imóvel permanecia até a chegada dela. Quando apontava na porta, era um desnorteio só... Ela com aquele ar suave que mudava a expressão desorientada daquele guri e enchia de brilho aqueles olhos estralados.

Tales prestava atenção em todos aqueles movimentos. Percorria com o pescoço os vai e vens pela sala e se perdia naquele balanço. Para ele, era o embalo mais bonito que já tinha observado.

Atento, se desprendia de conversas e do auê dos colegas. Se comprometia a copiar o roteiro escrito no quadro e terminar o mais ligeiro possível seus deveres. Quando terminava, eis que surgia a hora mais eufórica do dia.

O tal instante em que ele atravessava toda a classe e chegava perto da alongada, rodada e azul, saia da professora. O menino suava frio por entre os dedos, prendia o caderno contra o peito, como quem transportasse um tesouro e sofria por aproximação. Seu tema pronto era a desculpa para poder contemplar a beleza daquela saia delineada pela cadeira. A correção pouco o importava, do sorriso da professora, ele nem lembrava. Tales queria mesmo era morar embaixo da barra daquela saia para sempre... (ou até quando tocasse o sinal).

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