PERDA DE TEMPO
Entramos Uruguai
adentro, com destino certo e num ímpeto aventureiro que me acomete mais vezes
que deveria sugeri desviarmos o caminho e entrarmos em Montevidéu. O pessoal
estava com pressa, mas acomodada na extrema intimidade que me da a permissão
para ser chata, insisti.
“Pra que perder
tempo?” – perguntavam. Eu repetia que não existia isso de perder tempo, só no
caso de estarmos apostando uma corrida a dinheiro e pararmos para amarrar o
tênis, se não for algo semelhante a isso, como tirar o pai da forca, tudo é
tempo ganho.
Eu dei as dicas afirmando conhecer bem o
caminho. Passaríamos por uma avenida e sairíamos na estrada. Corajosamente,
ignoraram minha idiotice geográfica e acreditaram em mim. Fomos parar em um
arrabalde sensacional. Fiquei fascinada: cachorros enormes de carona com o dono
em cima de uma moto. Um mendigo tocando flauta tão bem quanto eu. Um varal mais
alto que um caminhão atravessando a rua sustentando camisas desbotadas, cuecas,
sutiãs enormes e lençóis que voavam ao vento morno. Crianças ranhentas rolando
na poeira com cuscos sarnentos.
“Onde estamos
que não acho a tal estrada? Olha o tempo que estamos perdendo!”
Meus olhos de
Poliana deslumbrados com
latas velhas, capôs de carros inúteis, tampas
enferrujadas de maquinas de lavar roupas com anúncios de “Dueño vende”.
Guriazinhas
dadeiras mostrando as pernas aos pedreiros suados. Sofás com molas saltando na
calçada, velhos tomando mate doce sob o sol inclemente.
“Estamos andando
a mais de uma hora neste inferno!”
Casas
abandonadas com marcas de incêndio. Taperas tapadas de hera.
“Vendo leche de
cabra”.
Namorados se
beijando nas sombras das árvores, mãos inquietas, desbravadoras. Caturritas
voando baixo. Depois uma estrada nunca antes percorrida por mim, casas antigas,
um gaiteiro solitário na porta, mulheres tirando água do poço.
Chegamos ao anoitecer. Minha irmã já havia
chegado há horas. A casa limpa, lençóis na cama, mesa posta, cervejinha
gelando, mate pronto, banho tomado.
Quando sentamos, ela não tinha muita história
para contar. Tempo perdido.
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