FUMAÇAS DE LILITH
Eu estava na
varanda, fumando ao ar livre o meu cigarro maldito, quando embaixo, na rua, um
casal vindo de mãos dadas rumo à feira, entre tantas pessoas e carros estacionados,
chamou-me a atenção.
À direita e à
frente, tinham, à igual distância, a benigna sombra que o prédio, em frente,
faz sobre a rua ao sol. O rapaz, querendo mudar para o outro lado da rua, puxou
a mulher pela mão de maneira abrupta, forte, autoritária, impondo sua vontade
sobre a dela. Naquele momento em que se dirigia, serenamente acompanhada,
àquela feira vespertina, tão famosa na cidade, a forma como fora puxada pelo
companheiro magoara-lhe o braço e o prumo.
Discutiram o
caminho. O rapaz, tendo segura sua mão, quer ainda atravessar a rua. Observo
que, no ponto em que estavam não fazia muita diferença como alcançariam a
sombra do prédio, se pela frente como seguiam ou se pela outra calçada. No
entanto, era evidente que, para a moça, o que fazia diferença era a forma de
ser conduzida pela mão. Com carinho, com exclusividade, não com sujeição. A
força do homem sobre
a disposição confiante e distraída do seu corpo humilhara
a mulher.
Repentinamente,
uma rusga de casal à minha frente, como prato quente ao sabor das minhas
reflexões saturninas... A maneira irritada com que a moça balançou a cabeça, e,
com determinação, retirou sua mão da dele e seguiu resoluta à frente, me
lembrou antigos personagens.
– Sempre a prepotência
masculina ...
– Sempre o grande
ódio feminino à sujeição...
Fosse eu aquela
moça, lágrimas negras já borbulhariam nos meus olhos, teria seca a garganta e,
do peito grandes dores ancestrais me teriam cegado a razão e o bom senso.
Vendo que ela seguindo
em frente não o obedecia, o rapaz ficou no meio do caminho, indeciso, sem a
posse da mulher e sem mais vontade de atravessar a rua. Pelo meio da pista
seguiu a companheira que, adiante, teve interrompido o caminho por carros
estacionados em cima da calçada. Este trecho da Rua 10 se lota com o público da
feira do sábado.
Rápido, o rapaz
aproximou-se da moça. Tão longe, não lhes pude ver o semblante. Sei que deram
alguns passos lado a lado. Reconciliados, o homem abraçou os ombros da mulher,
firme, meigo, cativado.
À força delicada
dos homens, o brinde da mulher! À força DELICADA, entendam bem.
Abraçados, enfim
já próximos das primeiras barraquinhas, atravessaram a rua e seguiram à sombra.
Quase já se confundiam entre as outras pessoas na calçada movimentada, quando o
rapaz, repentinamente, virou a cabeça para trás e olhou direto para mim.
– Meu Deus! Tão
longe, tão alto, no sétimo andar, na esquina oposta à feira, pega em flagrante
a minha curiosidade. E, com metafísica, ao contrário da pessoa em frente à
Tabacaria, enquanto me esgueirava pela porta, terminei o cigarro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário