CONTAGEM
REGRESSIVA
Quando faltava
meia hora para a meia-noite, Júlio desceu as escadas. Os cabelos alinhados com
gel. Bermuda e camisa brancas. Viu seu rosto queimado de sol ainda uma vez mais
no espelho, as olheiras profundas que destacavam olhos verdes e cansados. Pela
aparência, não adiantou muito esticar a sesta até mais tarde. Todos já o
esperavam no grande salão do andar térreo. Foi recebido com saudações efusivas,
incluindo as dos subordinados que, durante o ano inteiro, mal disfarçaram o
desejo de tomar o seu posto.
Os minutos
pareciam não passar. Ele esfregava as mãos, sorria sem graça e ouvia, sem
prestar atenção, as conversas ao redor. Olhou o relógio, impaciente. Quinze
minutos.
-Júlio, e o
champanhe, homem?
Justamente o
maior puxa-saco da empresa. Júlio apontou um grande recipiente com gelo, cheio
de bebidas dos mais variados teores alcoólicos.
-Júlio, esse ano
promete, hein? Essa tua política de expansão é de arromba, cara! Ninguém vai
resistir...ah!ah!ah!
Dois tapinhas
nas costas selaram aquela intervenção grosseira. Cinco minutos. Taças dispostas
na mesa. E a ansiedade o invadiu. À meia-noite, o primeiro a abraçar Júlio foi
um office-boy, rapaz promissor, talvez o único ali com alguma modéstia. Os que
estavam mais sóbrios estranharam quando Júlio prolongou o abraço ao garoto,
chorando convulsivamente.
-Foi um ano de
muitas conquistas pra ele. Está emocionado com razão.
Lágrimas ainda
escorriam por seu rosto ao receber uma ligação no celular.
-Senhor Júlio? É
do hospital. Acabamos de desligar os aparelhos.
E o colorido dos
fogos riscou o céu estrelado.
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