A CUIA
Ao lado da
casinha de taipa, a água cristalina escorria na bica feita de bambu cortado ao
meio e deslizava para o riacho corrente, formando um lago mais à frente, no
descampado da mata cerrada. O sol a pino estilava brilhos cintilantes das
grossas gotas d´água que batiam nas pedras e repicavam, formando um sutil
arco-íris em sua transparência esverdeada pelos arbustos que ladeavam o corte
do barranco úmido. Era prenúncio de primavera e um florido ipê amarelo se
despetalava sobre o telhado de palhaça do casebre do caboclo Terêncio, um jovem
e forte homem, à procura de um tesouro para ofertar à Maria, sua paixão
resguardada.
Sentado ao lado
da bica, ele ouve um pássaro cantador que, incessantemente, entoava o seu forte
canto de conquista. Era domingo e, no povoado distante, o sino repicava na
capela do Bom Senhor, onde por certo as andorinhas alvoroçadeiras se debandavam
da torre, assustadas com as badaladas estridentes.
Por aquelas
bandas de Minas, o garimpo era a única esperança de que no brilho da cuia, a vida
pudesse ter outra sorte. Rêncio, como era chamado pelos irmãos, levanta o
chapéu velho de feltro, limpa o suor que lhe escorre pela testa e espia a
corredeira chegando ao lago. Aperta os olhos para quebrar a claridade que lhe
ofusca as vistas. Na mão direita, segura uma cuia feita de cabaça madura, já
meio embolorada pelo tempo, com a qual costumava pegar lambaris no riacho.
Envolto em pensamentos descompromissados, beirando a sonhos, olha para o fundo
do poço de águas límpidas e vê num ponto reluzente, de brilho forte,
resplandecente pelos raios de sol que penetravam água adentro. De sobressalto,
misturando esperança com coragem, o caboclo saiu apressado com a sua cuia e
mergulhou fundo em busca daquele tesouro errante. Mas no caminho tinha uma
pedra... e num choque violento, o ouro se perde nas profundezas do barro
sangrento. A cuia leve dançava na correnteza e seguia o seu curso. Naquele
instante, o brilho da riqueza foi ofuscado pela dor e desilusão do caboclo
sonhador. Terêncio volta à bica, lava a mágoa e novamente assenta naquela pedra
a escutar o canto, que agora lhe parece tão triste, do pássaro
conquistador. Por anos a fio, ele
continua ali, olhando as águas ribeirinhas à procura da sua cuia...
Na cidade ainda
pacata, o sino da igreja do Bom Pastor não toca mais.
O caboclo jaz na
mata, sonhando com Maria e esquecendo o ouro das Gerais.
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