sábado, 3 de outubro de 2015

CAFÉ GOSTOSO COM MUITO AMOR - Conto de Vera Ione Molina Silva (Uruguaiana, RS)

CAFÉ GOSTOSO COM MUITO AMOR

Ele defendia as relações abertas, se queixava dos meus ciúmes. Um dia ele foi embora e eu não entendia por quê. No momento em que ele decidiu separar de mim, eu estava muito bêbada e, quando voltei à sobriedade, ele permaneceu irredutível.
Entrei numa depressão que me imobilizava. Fazia terapia três vezes por semana e tomava remédios para amenizar o sofrimento.
Chegou a época de eleições. Como eu tinha participação política, algumas amigas atraíram reuniões para a minha casa e, quando percebi estava envolvida com o comitê de um candidato do interior.
Apareceram pessoas daquela cidade e, entre elas, o presidente da Casa do Estudante. Vinte e um anos, cabelos cacheados, cigarro aceso para se sentir mais à vontade ou mais velho.
A reunião terminou e ele permaneceu, creio que esperando por alguém que telefonaria. Conversamos sobre a terra natal dele que eu chamarei de Nova Alegria. Era uma cidade onde predominava a colonização alemã. Banda na praça festejando o Dia do Motorista, comida farta preparada pela muter, cortinas xadrezes arrematadas por babados. Mas não era uma localidade muito pequena, havia uma universidade, movimento sindical e estudantil, bares e restaurantes sofisticados reunindo pessoas bonitas e vestidas com as roupas da moda.
Vez por outra, eu lembrava que o motivo pelo qual nos reuníamos era um candidato a deputado. Aquele movimento em minha casa, o telefone chamando me traziam pouco a pouco de volta para o mundo vivo. Marcelo era lembrado como aqueles namorados que idealizamos na adolescência, que só trazem paixão e prazer. Eu me entusiasmava cada vez que começavam a distribuir as tarefas do comitê e fazia jogos secretos enquanto aguardava o meu nome no mesmo grupo de trabalho que o dele. Marcelo-Lya, Marcelo-Lya, Marcelo-Lya... os dedos cruzados, o pensamento firme, o coração batendo forte.

Ele aguardava um telefonema e me inspirava tanta ternura que eu olhei nos olhos dele e perguntei: posso tocar nos teus cachinhos? Ele fez que sim com a cabeça e se encolheu no sofá. Depois me beijou, me fez carícias e, quando foi embora, combinou a próxima vez.
Corri para abrir a porta. Marcelo era o primeiro a chegar. O living encheu-se de gente com propostas de textos, de tarefas, pautas de discussão. Nós trocávamos olhares por cima das pessoas durante a reunião. Alguém pediu para ele ir à cozinha preparar um café porque era o mais próximo da porta. Eu saí desviando de almofadas, pés, mãos, caminhando sobre vinte pessoas para ajudá-lo.
Ele procurava uma chaleira e eu me inclinei sobre a mão dele para apanhá-la. Era o nosso primeiro e breve contato físico da noite e nossos corpos vibravam e nos olhávamos como se quiséssemos brincar de esconde-esconde.
Marcelo encheu a chaleira, enquanto eu procurava as xícaras, tudo devagarzinho para aquele momento só nosso durar muito. Ele me pedia o café, o filtro, tateava dentro dos armários para encontrar as coisas. Eu olhava para ele encantada, porque ele estava na minha cozinha como se fosse na sua própria casa.
Fechei a porta para não ouvir a discussão sobre conjuntura ou algo parecido. Nos movimentávamos em silêncio.
Caminhei até a janela. A vista do rio me transmitia a calma de que necessitaria para voltar à sala com as bandejas. Ele chegou por trás e me abraçou, colando o corpo ao meu. Me beijou os cabelos, o pescoço, acariciou minhas costas, segurou minha cintura dizendo algo elogioso e eu me voltei para ele.
Marcelo levou minha mão para o botão da calça jeans. Não consegui abrir. Ele ajudou, um sorriso malandrinho. Desceu a calça e começou a levantar a minha saia. Eu o ajudei a tirar a calcinha e ele me ergueu sobre o balcão da cozinha. Ele era alto e a posição ficou perfeita. Eu beijei os cachinhos e me cheguei ao peito dele. Ele parecia ignorar a gente toda que nos esperava. Calmo, me tomou como se ele, de nós dois, fosse quem tinha trinta e seis anos e eu a mocinha de vinte e um.
Bateram à porta. A chaleira fervia. Ele gemia baixinho e eu não tanto. Os lábios dele tinham gosto de figo, o beijo, o vigor dos dentes fortes dos jovens, a pele e o cabelo... uma seda.

Nos vestimos sem pressa e rindo muito da brincadeira. Preparamos um café gostoso e o servimos com muito amor.

Um comentário: