A
CASA DA MINHA PRIMA
Eventualmente
eu viajava setecentos quilômetros para a minha terra natal quando morava em
Porto Alegre. A cidade era um pretexto para estar na casa da minha prima, uma
casa onde só existiam personagens, comandada por uma mulher contadora de
histórias.
Não
uso as narrativas que ela generosamente cedeu para mim porque ela tem uma filha
escritora e acho que a filha é a herdeira dessas tramas.
Mas
o que vou contar agora aconteceu entre mim e a prima.
Já
no final da vida, ela vivia recolhida ao quarto, então eu ficava muito lá
dentro com ela, depois que voltei para Uruguaiana.
Ela
estava deitada e eu cheguei com umas compras e uma revista publicada por uma
farmácia.
Deitei
ao lado da prima, abri a revista e vi sua unha pintada de vermelho apontando
para uma fotografia: "Eu conheço este moço", ela me disse surpresa.
Olhei
para ela, que ficou pensativa, e continuou: "Ele era meu colega na
Filosofia e vivia brigando com os padres porque queria acrescentar outros
filósofos na ementa do curso. Ele era ateu, era contra estudarmos só filósofos
católicos. Chegou uma hora que ele cansou de discutir com os padres e me pediu
para assinar os meus trabalhos.
Ele
sumia tempos, até pela Rússia andou. Depois desistiu do curso, acho. Nunca mais
vi o Sérgio. Sim era Sérgio o nome dele. Sergio Faraco."
Falei
que sim, ele era um escritor muito conhecido, na minha opinião, o maior
contista do Brasil.
Ela
ficou pensativa e calada, perdida na enorme cama.
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