ALGUMAS
IMPRESSÕES ALÉM MAR
Eu
parti bem recomendada. Anotar tudo o que visse por lá e, na volta, fazer alguns
relatos. Custo um pouco para retomar a rotina, e racionalizar tudo o que
reparei. A viagem continua a viajar dentro de mim e gosto de ficar sozinha com
ela por um determinado tempo.
Confesso
que queria ver de novo, para melhor revelar as sensações e o “maravilhamento”
que me invadiu em determinados lugares, mais que em outros.
Descobri
– por de trás da pequena janela de um bonde que ziguezagueava ringindo ferros –
as ruelas e os casarios desbotados da velha Lisboa, na margem norte do Tejo.
Uma cidade rica em tradição, com memórias de um longo passado e que mantém com
o presente fortes ligações sem perder a autenticidade.
Ali
pertinho, Queluz e Sintra, estância real de veraneio, revelavam as riquezas de
seus palácios (e, principalmente, das antigas colônias portuguesas).
Entretanto, nada se comparou a graça de Cascais – antiga vila de pescadores –
hoje, uma das áreas residenciais mais elegantes de Portugal. Num restaurante ao
ar livre – perto do edifício onde mora o filho do Felipe Scolari – comi um
bacalhau à portuguesa, seguido de uma taça de vinho do Porto, com uma brisa
amena que soprava do mar. Respirei fundo, fechei os olhos e me vi ali para
sempre...
Catarina,
nossa guia, uma portuguesinha miúda, encantou o grupo com suas informações bem
contextualizadas. Suas expressões idiomáticas eram singulares e, algumas
ficaram presentes na memória pela sonoridade de um português cadenciado, bem
articulado, íntimo e cerimonioso.
Seguidamente,
repetia “venham cá ao pé de mim”. E quando íamos sorria agradecida. À noite,
brindava-nos com a expressão: – “Senhores, deixo-vos agora. Durmam e descansem
no vale de vossos lençóis”. Relembro a figura pequena e ágil que mantinha com
firmeza, sob sua tutela, o grupo todo e tenho “saudades de vossa pessoa”.
Catarina concluía o Mestrado em História e, com naturalidade, distribuía seus
conhecimentos, sua alegria e o orgulho de ser portuguesa.
Conduzia-nos
pelo Bairro de Alfama, chamando a atenção para o seu aspecto medieval; pela
Baixa Pombalina, bairro comercial e reconstruído após o grande terremoto de
1755; pela Praça do Comércio e do Rossio, com a estátua de Dom Pedro IV, (Pedro
I, no Brasil); pela Torre de Belém construída no sec. XVI e por outros tantos
lugares sempre recheados de pequenas curiosidades que circulavam pelos locais
visitados.
À
noite, numa Casa de Fados chamada “Forcados”, encontrei uma Lisboa de várias
origens. Fundada há muitos anos por mercadores fenícios foi depois habitada por
gregos, cartagineses, romanos, visigodos e mouros. As etnias mesclaram-se ao
longo da viagem, na arquitetura, na gastronomia, mas nessa noite, a música era
só de pura saudade...
Quase
ao lado do Mosteiro do Jerônimo, encontrei os pasteis de Belém, depois de uma
longa fila que seguia pela calçada. A espera foi recompensada pela delícia
gastronômica inigualável. Comi, ali mesmo, uns dois ou três e comprei uma
caixa, com seis, para viagem. Era impossível não comprar. À noite, no quarto do
hotel, em cima da cama como criança a fazer travessuras, terminei com os
pasteis. Ao longo da viagem, outros – ditos de Belém – só comprovaram que a receita
original estava muito bem guardada.
Em
Óbidos, um dos melhores exemplos de cidadela medieval da Europa, andava por
estreitas ruelas e pequenas praças com tendas e lojinhas repletas de artigos
para presente. Óbidos foi um presente de casamento à Rainha Isabel, para que
tivesse seu próprio rendimento com o pagamento de taxas e impostos. Ali, à
venda, a famosa porcelana de Coimbra. Precisaria eu de muitos impostos não
pagos para poder trazer todos os pratinhos que desejei dessa porcelana da qual
levo o nome.
No
Mosteiro da Batalha (1385) – obra prima da arquitetura gótica portuguesa – me
perdi do grupo. Fui absorvida pelas sombras dos corredores imensos e envolta
pela névoa que parecia estar ali só para me prender a outra época. Lembrei da
Batalha de Aljubarrota, (que Catarina explicara) travada pelo Príncipe D. João,
filho bastardo do rei, contra os espanhóis de Castela e da promessa que fez –
Se vencesse a batalha ergueria ali um mosteiro em homenagem a Nossa Senhora da
Batalha. Depois de algum tempo, receosa, enfrentando uma batalha interior,
agradeci à Senhora daquele lugar por encontrar a saída, por estar de volta ao
meu tempo e ao meu grupo de viagem. E, hoje, a minha coluna...
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