HAVAIANAS
No
Sábado último, eu encontrava-me sentado no muro do meu prédio, quando do fundo
da rua, avistei uma mulher deslumbrante a se aproximar.
Cada
fibra do meu corpo apelava para que eu a abordasse, mas atordoado pelo receio
da rejeição, ela passou por mim sem que um pio sequer eu soltasse…
Seguidamente,
pensei comigo mesmo:
«Que
mudaria em mim se ela me rejeitasse? Absolutamente nada… Eu continuaria sendo o
mesmo idiota de sempre.» – [esta vai especialmente para os tímidos]
Desafio
assumido…
Com
ela já afastada de mim, mas não distante, eu gritei:
—
Oi!
A
mulher voltou a sua cabeça pra trás, acenei-lhe e disse:
—
Poderias, por gentileza, aguardar um instante?
Cortês,
ela atendeu o meu pedido. Na sequência, saltei do muro e, embora trémulo,
caminhei na sua direcção, enquanto pensava no que lhe falar ao chegar a si.
Imagina
agora uma situação em que a caminhares ao encontro duma dama, o arame que tu
usaras pra prender a tira do teu chinelo se soltasse, e esta dama testemunhasse
tal infortúnio…
Eu
não preciso imaginar, dado que foi exactamente isso que me ocorreu.
(i)
Continuar caminhando a seu encontro com um pé descalço, como se nada tivesse
acontecido, ou (ii) fingir que eu não havia acenado pra ela; recolher o meu
chinelo rebentado; dar meia-volta e retornar ao muro?…
Encantoado
neste dilema, acabei por não seguir nenhuma das alternativas arroladas – ambas
constrangedoras, que o diga, limitando-me apenas a ficar imóvel, olhando pra
ela.
Guiada
não sei por que motivo, vendo-me ali parado, a mulher veio a mim e disse:
—
Pois não?
Ela
tinha uma voz aveludada que, por acaso, foi a minha deixa:
—
Tu tens a voz da futura mãe dos meus filhos. – arisquei no engate.
Ela
sorriu e disse:
—
Com que então tu prevês o futuro?
—
Não! – respondi-lhe – Tenho tido bons palpites. Para esta noite, por exemplo,
vejo nós dois tendo um jantar encantador.
—
Quem sabe… – ela disse, enquanto trocávamos os contactos.
Retornando
ao meu prédio, incrédulo, eu questionava-me sobre o que teria concorrido para a
relativa facilidade com que a minha abordagem lograra.
Não
estou, de modo algum, a insinuar que tenha sido o meu charme… Ah! A quem eu
quero enganar? Foi o meu charme, sim…
À
noite, liguei-lhe e fomos jantar a um restaurante.
Ela
foi bastante fina à mesa: escolheu um vinho fino; um prato fino e passou um
pente fino na minha carteira.
Eu,
por outro lado, no cardápio não olhava para os pratos, mas para os preços –
quanto mais baixos, mais a minha cara…
Feitos
os pedidos, pedi licença à minha acompanhante e, discretamente, fui interceptar
o garçom antes que este submetesse os pedidos:
—
Ó garçom, a sua atenção, se me faz o favor!
—
Pois não!
—
Olhe, o pedido que a minha amiga efectuou violenta o meu bolso. Eu não falei
isto à mesa porque não quis apresentar dificuldades logo no primeiro encontro.
Aceite esta gorjeta, na condição de a informares que o pedido dela, de tão
solicitado que é, acabou se esgotando e sugira-lhe um prato tão barato quanto o
meu.
—
Tendo, o garçom, acatado o meu pedido, voltei à mesa mais descontraído.
Degustávamos
o aperitivo enquanto nos explorávamos mutuamente quando o garçom chegou a nós
informando que o prato dela se havia esgotado, blá blá blá…
Foi
então que ela me puxou a si pelo braço e falou-me ao ouvido:
—
Mate, eu vi-te a consertares o teu chinelo com arame. Decerto, eu não esperava
que pagasses pelo jantar. Pede, por favor, ao garçom que me sirva exactamente o
que pedi que eu pago.
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