sexta-feira, 22 de abril de 2016

HAVAIANAS - Crônica de Augusto Mate (Maputo, Moçambique)

HAVAIANAS

No Sábado último, eu encontrava-me sentado no muro do meu prédio, quando do fundo da rua, avistei uma mulher deslumbrante a se aproximar.
Cada fibra do meu corpo apelava para que eu a abordasse, mas atordoado pelo receio da rejeição, ela passou por mim sem que um pio sequer eu soltasse…
Seguidamente, pensei comigo mesmo:
«Que mudaria em mim se ela me rejeitasse? Absolutamente nada… Eu continuaria sendo o mesmo idiota de sempre.» – [esta vai especialmente para os tímidos]
Desafio assumido…
Com ela já afastada de mim, mas não distante, eu gritei:
— Oi!
A mulher voltou a sua cabeça pra trás, acenei-lhe e disse:
— Poderias, por gentileza, aguardar um instante?
Cortês, ela atendeu o meu pedido. Na sequência, saltei do muro e, embora trémulo, caminhei na sua direcção, enquanto pensava no que lhe falar ao chegar a si.
Imagina agora uma situação em que a caminhares ao encontro duma dama, o arame que tu usaras pra prender a tira do teu chinelo se soltasse, e esta dama testemunhasse tal infortúnio…
Eu não preciso imaginar, dado que foi exactamente isso que me ocorreu.
(i) Continuar caminhando a seu encontro com um pé descalço, como se nada tivesse acontecido, ou (ii) fingir que eu não havia acenado pra ela; recolher o meu chinelo rebentado; dar meia-volta e retornar ao muro?…
Encantoado neste dilema, acabei por não seguir nenhuma das alternativas arroladas – ambas constrangedoras, que o diga, limitando-me apenas a ficar imóvel, olhando pra ela.
Guiada não sei por que motivo, vendo-me ali parado, a mulher veio a mim e disse:
— Pois não?
Ela tinha uma voz aveludada que, por acaso, foi a minha deixa:
— Tu tens a voz da futura mãe dos meus filhos. – arisquei no engate.
Ela sorriu e disse:
— Com que então tu prevês o futuro?
— Não! – respondi-lhe – Tenho tido bons palpites. Para esta noite, por exemplo, vejo nós dois tendo um jantar encantador.
— Quem sabe… – ela disse, enquanto trocávamos os contactos.
Retornando ao meu prédio, incrédulo, eu questionava-me sobre o que teria concorrido para a relativa facilidade com que a minha abordagem lograra.
Não estou, de modo algum, a insinuar que tenha sido o meu charme… Ah! A quem eu quero enganar? Foi o meu charme, sim…
À noite, liguei-lhe e fomos jantar a um restaurante.
Ela foi bastante fina à mesa: escolheu um vinho fino; um prato fino e passou um pente fino na minha carteira.
Eu, por outro lado, no cardápio não olhava para os pratos, mas para os preços – quanto mais baixos, mais a minha cara…
Feitos os pedidos, pedi licença à minha acompanhante e, discretamente, fui interceptar o garçom antes que este submetesse os pedidos:
— Ó garçom, a sua atenção, se me faz o favor!
— Pois não!
— Olhe, o pedido que a minha amiga efectuou violenta o meu bolso. Eu não falei isto à mesa porque não quis apresentar dificuldades logo no primeiro encontro. Aceite esta gorjeta, na condição de a informares que o pedido dela, de tão solicitado que é, acabou se esgotando e sugira-lhe um prato tão barato quanto o meu.
— Tendo, o garçom, acatado o meu pedido, voltei à mesa mais descontraído.
Degustávamos o aperitivo enquanto nos explorávamos mutuamente quando o garçom chegou a nós informando que o prato dela se havia esgotado, blá blá blá…
Foi então que ela me puxou a si pelo braço e falou-me ao ouvido:

— Mate, eu vi-te a consertares o teu chinelo com arame. Decerto, eu não esperava que pagasses pelo jantar. Pede, por favor, ao garçom que me sirva exactamente o que pedi que eu pago.

Nenhum comentário:

Postar um comentário